'Não penso em fazer sucesso nos EUA', diz criador de 'Cowboy bebop' Shinichiro Watanabe está no Brasil para participar do Anima Mundi. Versão hollywoodiana do anime é projeto antigo de Keanu Reeves.

Shinichiro Watanabe em São Paulo
(Foto: Gustavo Miller/G1)

Caubóis trocam tiros ao som de jazz e blues enquanto samurais se retalham com hip-hop de trilha de fundo. Essa mistura de elementos da cultura pop com cenas indigestas e cômicas, tão comuns no cinema de Quentin Tarantino, é também a assinatura de Shinichiro Watanabe, autor dos conceituais e populares animes “Cowboy bebop” (1998-1999) e “Samurai champloo” (2004-2005).

“Fico muito honrado quando me comparam ao Tarantino, estou ouvindo isso pela primeira vez aqui no Brasil. Mas quem gosta muito de ‘Cowboy bebop’ é o Robert Rodriguez”, diz aoG1 o diretor e escritor japonês. Sem falar um “oi” ou "hi" em português ou inglês, e sempre acompanhado de uma tradutora, ele está no Brasil nesta semana para participar do festival Anima Mundi, que já passou pelo Rio e fica em São Paulo até o dia 31 de julho.

Com seus inseparáveis óculos escuros – “são a minha marca registrada”, brinca – ele fez duas concorridas palestras no evento e mostrou trechos de seus trabalhos, como o inédito e melancólico curta “Baby blue”. O filme baseado em sua obra maior, “Cowboy bepop” (2001), tem sessões nos cinemas paulistanos a partir desta sexta (29) - veja programação completa no site do evento.

O desenho futurista sobre um grupo de caçadores de recompensa é há muito tempo alvo de especulações sobre uma versão hollywoodiana em “live action”. Keanu Reeves, fã confesso do anime, tenta há anos levar o projeto adiante, mas se depender de Watanabe...

'Cowboy bebop' foi produzido entre 1998 e 1999 (Foto: Divulgação)

“Você não tem liberdade criativa quando assina um contrato para ter a sua animação adaptada em Hollywood. Também pedem muitas mudanças na hora de virar um filme e sempre tomei muito cuidado com ‘Cowboy bebop’, porque quero ser o mais fiel ao anime”, afirma ele, que dá de ombros para o mercado norte-americano.

“Não penso em fazer sucesso nos EUA, vem várias ofertas de lá, mas sei que não terei tanta liberdade para criar. Eu não sinto essa necessidade. Ainda estou escrevendo a história do filme, sei que há uma pressão de Hollywood, mas ainda não sei se vai virar...”, continua ele, que gosta de definir o seu trabalho como um champuru, expressão usada na província de Okinawa para comidas que são uma “mistureba”.

Os personagens de 'Samurai champloo'
(Foto: Divulgação)

“Gosto de muitas culturas e as cidades que eu gosto, como Nova York, são a mistura de várias. Acho interessante esse mix, porque em vários filmes o que mostram são apenas um cenário isolado. Eu gosto de juntar, recortar e colar tudo depois”, afirma ele, que diz ter o cineasta Sam Peckinpah como grande influência.

Perguntado se admira o trabalho de Reeves – Watanabe dirigiu dois curtas-metragens da série “Animatrix”, um tipo de prelúdio animado da trilogia “Matrix” -, o diretor responde de bate-pronto. “O único ator que eu queria [para o filme] é japonês, mas ele já morreu...”, ri.

Watanabe é um aficionado por música brasileira, especialmente por MPB e bossa-nova – em “Cowboy bepop” há um trio de velhinhos chamado Antônio, Carlos e Jobim. Produtor-musical do anime “Michiko e Hatchin”, cujo pano de fundo é inspirado no Brasil, ele contratou o produtor musical Alexandre Kassin para cuidar da trilha sonora, cuja sonoridade lembra Sérgio Mendes & Brasil 66.

“Marcelo D2, Roberta Sá e Adriana Cal-can-ho-tô”, diz, com certo esforço, sobre o que baixou para o seu iPod nos últimos dias.